Festival da Canção 2011: Segundo dia de ensaios em revista

O segundo dia de ensaios para o Festival RTP da Canção 2011 decorreu esta tarde e já foi possível vislumbrar mais um pouco do que vai ser mostrado na grande noite. O empenho e concentração de todas as equipas foi visivelmente maior e os ecrãs led já mostraram as animações previstas.

Só ficou a faltar o guarda roupa, mas para isso vamos ter que aguardar emissão televisiva, já que o ensaio geral de amanhã será vedado à assistência.

Canção 1: Embalo do coração - 7 Saias


Vídeo: Nelson Costa

Motivos tradicionais nos ecrãs para uma canção enraizada na musicalidade tradicional portuguesa. Como escrevi ontem, continuo a pensar que o instrumental tinha potencial para evoluir de forma mais intensa e marcante. A actuação de hoje teve mais entusiasmo, por parte das três vocalistas, mas a estrutura da apresentação manteve-se longe da dinâmica que a canção sugere. Sem falhas a apontar em termos vocais.

Se a intenção das 7 Saias é apenas aparecer e promover o seu trabalho o objectivo está conseguido. Mas a verdade é que, com um pouco mais de ambição e criatividade, este Embalo do coração poderia ter competido por um lugar em Düsseldorf, marcando pela diferença. Sinceramente, hoje soube-me a pouco.


Canção 2: Sobrevivo - Carla Moreno


Video: Nelson Costa

Actuação irrepreensível por parte de Carla Moreno e de toda a equipa que defende Sobrevivo. O grafismo escolhido leva-nos para a pista de dança referido no início da letra, e só com muita má vontade é que alguém consegue ficar indiferente ao ritmo. A coreografia encaixa-se perfeitamente no espírito do tema e segue todos os requisitos festivaleiros, sem no entanto cair em exageros e exibicionismos despropositados.

Pessoalmente, e embora esteja longe de ser um apreciador do estilo musical de Sobrevivo, tendo em conta a prestação no seu todo, tenho que admitir que não me sentiria minimamente embaraçado ou desconfortável se esta canção viesse a representar-nos na Alemanha. E a julgar pela actuação desta tarde acredito que esta é uma séria candidata à vitória.


Canção 3: São os barcos de Lisboa - Nuno Norte


Video: Nelson Costa

A canção interpretada por Nuno Norte é um postal de Lisboa, e esse tema é replicado nos ecrãs. O instrumental é impressionante por si só mas, em conjunto com a voz do Nuno, chega a causar arrepios. Dos bons. E tenho a certeza que ainda não foi hoje que o Nuno Norte usou todo o seu potencial vocal. A apresentação em palco é simples e elegante, como a canção pede.

Em resumo, esta é uma proposta muito forte e cheia de carisma, que equilibra bem os requisitos festivaleiros, os elementos étnicos e a personalidade artística do intérprete. Num ano em que as escolhas europeias têm primado pela mediania e indiferença, esta proposta teria seguramente um lugar de destaque no palco europeu. Mas para isso tem que vencer o Festival. E para mim, neste momento, está claramente na linha da frente.

Canção 4: Em nome do amor - Rui Andrade


Video: Nelson Costa

O azul escuro do mar profundo domina o ambiente visual da apresentação de Em nome do amor, com toda a coerência. E é de louvar a coragem de Rui Andrade em assumir sozinho a responsabilidade e o risco de defender um tema tão forte. Mas já ontem ficou confirmado que o Rui tem as capacidades vocais para o fazer. A opção pela simplicidade da apresentação é outro risco, quando o instrumental está mesmo a pedir um coro e muito dramatismo. Correr riscos às vezes compensa e a simplicidade pode marcar pela diferença.

Em nome do amor conjuga uma série de sonoridades que nos são muito familiares, por vezes de forma um pouco artificial e demasiado calculada. Mas o entusiasmo e a presença do Rui Andrade acabam por compensar essas falhas. Esta canção tem requisitos para agradar a júris e a telespectadores, pelo que, num ano tão equilibrado em termos de competitividade, pode bem vir a surpreender.


Canção 5: Quase a voar - Henrique Feist


Video: Nelson Costa

Os ecrãs estão lá e têm animações, como aconteceu com as restantes apresentações, mas o olhar do espectador concentra-se totalmente na exuberância e na exigência da coreografia. Henrique Feist mostra aqui o porquê de ser um nome incontornável no teatro musical português, sendo digna de registo a forma como segura e prolonga a última nota. Nuno Feist, por seu lado, confirma o seu brilhantismo e criatividade enquanto compositor.

Aqueles que, a par da sonoridade portuguesa deste tema, julgam escutar ritmos de Israel e da Europa de Leste não podiam estar mais certos. Quase a voar foi escrita para conjurar, em três minutos, o espírito e as raízes musicais de toda a Europa. E consegue fazê-lo de forma sublime, sem cair em estereótipos e facilitismos. É um dos temas a concurso que mais se destaca pela diferença. E na hora de recolher os votos pode vir a voar bem alto até à Alemanha.


Canção 6: Chegar à tua voz - Wanda Stuart


Video: Nelson Costa

A predominância da cor azul em todo o palco dispensa explicações, afinal estamos perante Wanda Stuart. Toda a carga dramática do instrumental e da interpretação tem tradução directa na encenação. E aqui o dramatismo é levado ao limite. Não é possível ficar indiferente. A Wanda agarra o tema com a garra e o carisma que já lhe conhecemos.

Chegar à tua voz é mais uma proposta muito forte e arrojada. Quanto a mim só fica a faltar alguma dinâmica aos elementos do coro. A magia, a intensidade épica, o ambiente denso da canção e a classe de Wanda Stuart são os ingredientes que fazem desta proposta uma das favoritas para chegar ao primeiro lugar.


Canção 7: Se esse dia chegar - Tânia Tavares


Video (excerto): RTP

Durante esta tarde a Tânia Tavares não esteve tão bem como no ensaio de ontem, mas certamente esse facto terá a ver com alguma desconcentração causada por algumas das dificuldades técnicas verificadas. Em todo o caso não deixou de dar mais uma clara demonstração da beleza e do poder da sua voz, em perfeito acordo com a melodia desta balada. O grafismo, a coreografia e os coros também estiveram em perfeita harmonia.

Se esse dia chegar não será a mais inovadora e carismática das canções que vão desfilar no palco do Teatro Camões, mas é apresentada com alma, simplicidade e elegância. Não sei se chegará amanhã o dia de premiar, com a vitória, o talento de Tânia Tavares, mas será certamente merecedora de um eventual Prémio Revelação.

Canção 8: Deixa o meu lugar - Inês Bernardo


Video: Nelson Costa

Doçura é a palavra que melhor descreve esta canção e a presença da Inês Bernardo. Já a voz, para além de igualmente doce, tem uma forte carga de sensualidade, que poderia ser mais explorada. A opção cénica sublinha o lado mais romântico e algo cândido do tema, sem cair em clichés lamechas, felizmente.

Deixa o meu lugar é muito diferente de todas as outras canções a concurso, e mesmo daquilo que estamos habituados a ouvir no Festival. E isso só pode ser bom. Tem ao mesmo tempo uma sonoridade familiar, lânguida, que se insinua, que nos conquista e conforta lentamente. Uma delícia! Por ser tão diferente é a maior incógnita do desfile. A ver e ouvir com atenção redobrada. Ah e se não for pedir muito, senhores produtores musicais, não deixem escapar a Inês.


Canção 9: Tensão - Filipa Ruas

Video: Nelson Costa

Durante a fase online esta foi uma das canções que mais me chamou à atenção. O refrão é viciante e o instrumental é tão sueco como o IKEA. O grafismo nos ecrãs led está particularmente bem conseguido e a Filipa Ruas consegue agarrar o tema com facilidade. Ao nível da apresentação em palco a opção foi por um compromisso, mas o resultado é pouco coeso e definido.

Tensão é uma canção pop em estado puro, não precisa de guitarras e baterias. Precisa é de coreografia, precisa de figurinos arrojados, sensuais e divertidos. Se a referência é o Melodifestivalen então o mais coerente seria levar essa opção até ao fim. Esta indefinição pode comprometer um bom resultado, o que é pena, já que, no que diz respeito ao Festival da Canção, esta proposta é uma lufada de ar fresco e teria potencial para vencer com toda a facilidade.


Canção 10: Luta é Alegria - Homens da Luta


Video: Nelson Costa

Os Homens da Luta são um caso bicudo de avaliar. É impossível deixar de ter em consideração que se trata, fundamentalmente, de um número humorístico, com um conteúdo de protesto social e de ironia. E embora não seja grande admirador do género, creio que são um valor acrescentado para o Festival. Quanto mais não seja por valorizar a diversidade.

Quanto à actuação desta tarde, pecou um pouco pela falta de entusiasmo e empenho de alguns dos elementos em palco. Se o tema da canção é a Luta e a Alegria não faz grande sentido deixá-las nos bastidores. Também esperava uma encenação mais elaborada e coerente com o instrumental. Seis pessoas alinhadas a marchar à frente do palco,empunhando cartazes, na minha óptica, são mais sinónimo de manif do que de festa.

Mas o que me desperta mais curiosidade é o resultado que os Homens da Luta podem vir a ter e as reacções aos mesmos. Se vierem a ganhar o televoto, como é previsível, e depois vierem a cair na tabela de classificações por acção dos júris distritais, será que vamos ouvir os mesmos apupos e impropérios e as mesmas considerações sobre a "escolha dos portugueses", o "voto popular", o "verdadeiro vencedor" e dislates semelhantes, que se fizeram ler e ouvir no ano passado??? Cá estarei para apreciar.

Canção 11: Boom Boom Yeah! - Axel


Video: Nelson Costa

Boom Boom Yeah! tem sido uma das canções mais desprezadas pelos eurofans. O tipo de comentários que tenho lido, alguns bem deselegantes, parecem-me resultar fundamentalmente de um qualquer preconceito. Na sua essência esta é uma canção pop, com ritmos latinos e africanos à mistura, com um ritmo dançável e um refrão orelhudo. Quem delirou, recentemente, com um qualquer Dum Tek Tek, com um Allez Olla Olé, ou mais recentemente com um qualquer Haba Haba, dificilmente pode criticar este Boom Boom Yeah!

Em palco Axel mostra mais uma vez um grande à vontade e segurança, testemunhos de uma experiência de palco considerável. A opção pelos bombos, em vez de uma coreografia mais elaborada pode retirar algum dinamismo à coreografia, mas empresta-lhe um sabor mais tradicional. Estou convencido que esta é uma proposta que resultaria bem em Düsseldorf, ainda para mais quando os nossos concorrentes nos círculos da emigração estão todos na nossa semifinal, mas com canções pouco entusiasmantes. Quanto a sábado à noite, convém lembrar que Portugal não é Lisboa e o Festival não se resume aos eurofans. A existir um dark horse, é este.

Canção 12: O mar, o vento e as estrelas - Ricardo Sousa


Video: Nelson Costa

O encerramento do desfile cabe a Ricardo Sousa. Como escrevi ontem a versão final de O mar, o vento e as estrelas resulta bem melhor. No entanto não posso deixar de manter que esta é uma proposta que parece ter cristalizado algo do espírito do Festival de outros tempos. Aqui revive-se 1987 e os Nevada.

Vocalmente Ricardo Sousa está irrepreensível e tem uma presença simpática. A apresentação em palco é coerente e o grafismo escolhido enquadra-se bem no tema. Creio que esta proposta deve ser vista à luz da diversidade pelo que serve uma das várias dimensões do Festival, que é ser uma montra e uma festa da música portuguesa. A esse nível cumpre plenamente. No que concerne à competição, não creio que venhamos a ter uma surpresa.

Fonte: ESC Portugal / Imagem (c): RTP